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1 de abr. de 2017

Schopenhauer - De como viver é sofrer (Parte I)



O consolo mais eficaz em toda infelicidade, em todo sofrimento, é observar os outros, que são ainda mais infelizes do que nós.” Arthur Schopenhauer


Em seus escritos “Contribuições à doutrina do sofrimento do mundo”, o filósofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860) afirma que o sentido mais próximo e imediato de nossas vidas é a dor e o sofrimento, que – sem sentido e puramente acidental – é originária da necessidade essencial à vida.

Ele diz que tudo o que é desagradável e dolorido salta à vista. E isso porque somos dotados de uma espécie de aplicativo que detecta os aborrecimentos muito mais que os prazeres: “Nós não sentimos a saúde do nosso corpo, mas apenas o pequeno local onde o sapato nos aperta (...)”.

Geralmente, não temos por hábito reconhecermos que as coisas vão muito bem, obrigado, mas insistimos no que ainda falta, por mais insignificante que seja, se comparado com o todo. É nisto que se baseia o que Schopenhauer chama de “negatividade do bem-estar e da felicidade” em oposição à “positividade da dor”. Em noventa e nove elogios, uma única crítica é o que destacamos, pois, via de regra, consideramos as alegrias abaixo e as dores, bem acima de nossa expectativa.

Ponderando sobre a negatividade do bem-estar e a positividade da dor, o filósofo salienta que “(…) a maioria dos sistemas metafísicos declaram o mal como algo negativo; enquanto é justamente positivo, o que em si mesmo se torna sensível; pelo contrário o bem, toda felicidade e satisfação, constitui o negativo, ou seja, a simples supressão do desejo e a eliminação de um tormento”.

Schopenhauer nos chama a atenção para o fato de que viver não é fácil: “Parecemos carneiros a brincar na relva, enquanto o açougueiro já está a escolher um ou outro com os olhos, pois em nossos bons tempos não sabemos que infelicidade, justamente agora, o destino nos prepara (..)”. De fato, doença, desemprego, empobrecimento, loucura, traição, abandono e morte, estão mesmo sempre à espreita.

A história comprova que os povos vivem em guerra e que, exceção, a paz é momentânea, passageira. Assim se dá com os indivíduos, sempre em luta constante: “Também contribui para o tormento de nossa existência, o impelir do tempo, impedindo-nos de tomar fôlego, perseguindo todos qual algoz de açoite.”.

No entanto, diz ele, se a pressão da necessidade, dificuldade, contrariedade e frustração das pretensões fossem afastadas da vida dos homens, sua petulância cresceria: “Cada um necessita sempre de um certo quantum de preocupação, ou dor, ou necessidade, como o navio de lastro para navegar de modo ereto e firme.”.

Realmente, trabalho, aflição, esforço e necessidade constituem durante toda a vida a sina da maioria das pessoas, porém –, ele indaga – se todos os desejos, apenas originados, já estivessem resolvidos, o que preencheria então a vida humana, com que se gastaria o tempo?

O filósofo imagina uma situação onde todas as vontades fossem satisfeitas (aves revoassem já assadas, brinca ele) e diz que isso não serviria de palco à espécie humana.

Sendo assim, “Em consequência da relembrada negatividade [no sentido de não se destacar] do bem-estar e do prazer, em contraste com a positividade [no sentido de se fazer notar] da dor, a felicidade de um determinado curso de vida não se estima segundo suas alegrias e prazeres, porém pela ausência dos sofrimentos, como sendo o positivo.”.

Considerando que a sorte dos animais parece ser mais suportável que a do homem, Schopenhauer parte para análise de ambas.

Por mais variadas que sejam as formas sob as quais a felicidade e a infelicidade do homem se apresentam e o estimulam à perseguição ou à fuga, a base material de tudo isto forma o prazer OU a dor corporal: “Esta base [material] é muito reduzida: constitui saúde, alimentos, proteção do frio e da umidade e satisfação sexual. OU então, a carência dessas coisas.”.

Sendo assim, quanto a prazeres físicos reais, o homem não possui mais necessidade do que o animal. A não ser quando seu sistema nervoso de potência superior amplia as sensações de prazer e/ou de dor: “Mas quão mais poderosas são as afecções nele [no homem] excitadas, comparadas às dos animais! Com que profundidade e intensidade superior é mobilizada sua sensibilidade! Para, por fim, atingir apenas um resultado idêntico: saúde, alimento, proteção, etc.”.

Nossas sensibilidades são mais profundas e intensas que as dos animais porque pensamos! E pensar (no passado, no ausente, no futuro) faz surgir, ou seja, dá existência a preocupação, temor, esperança e esses sentimentos atuam sobre nós com muito mais intensidade do que na simples realidade presente – seja prazerosa ou de sofrimento – na vida dos animais.

Ao animal falta a reflexão (memória, que resgata passado e previsão, que delineia futuro), que é o condensador das alegrias e dos sofrimentos. O animal vive o presente, daí a invejável despreocupação e tranquilidade dos animais, observa o autor.

Mediante a reflexão e o que a ela se prende, desenvolve-se no homem, à partir daqueles elementos do prazer e do sofrimento, um acréscimo da sensação de sua felicidade e infelicidade, que pode conduzir ao encantamento momentâneo ou à angústia mais profunda.

Se observarmos mais de perto, o curso do processo é o seguinte: nossas necessidades, originalmente supridas com apenas um pouco mais de dificuldades do que as dos animais, nós mesmos as ampliamos propositalmente, para assim aumentarmos nosso prazer, donde então, perseguimos as iguarias gastronômicas, o luxo nas vestes, bebidas alcoólicas, tabaco e tudo o mais.

Também por conta de sermos dotados da capacidade de refletir se acrescenta uma fonte a jorrar unicamente para nós, de prazer e, portanto também de sofrimentos que exige atenção desmesurada que é a ambição e o sentimento de honra E também a vergonha, o pudor.

Desses sentimentos surge a importância da nossa opinião sobre a opinião dos outros a nosso respeito [e pensar que nem havia a “régua” das redes sociais!”]: “Esta [opinião dos outros] torna-se, em figuras mil e frequentemente estranhas o fim de quase todas as suas pretensões além do prazer físico ou da dor.”.

Schopenhauer observa: “Embora possua a mais do que os animais ainda os prazeres intelectuais, a permitirem muitas graduações, da brincadeira mais ingênua, ou da conversação, até as realizações espirituais mais elevadas, em contrapartida, do lado dos sofrimentos, se situa o tédio (…), que no homem se configura em verdadeiro algoz, como se vê particularmente naquela multidão lastimável dos que constantemente se preocuparam somente em preencher seu bolso, mas nunca sua cabeça, e aos quais justamente sua abastança se transforma em castigo, ao entregá-los às mãos do tédio mortificante (…), pois, seguramente a necessidade e o tédio formam os dois polos da vida humana.”.

Além disso, diz ele, no homem se associa à satisfação sexual uma escolha obstinada, própria unicamente à ele, que (...) se constitui em fonte de longos sofrimentos e alegrias passageiras.

É admirável como mediante a adição do pensamento, de que carecem os animais, sobre a mesma estreita base [material] dos sofrimentos e das alegrias, de posse comum com o animal, se ergue o edifício tão alto e extenso da felicidade e da infelicidade humana, em relação a que sua disposição emocional está entregue a afecções, paixões e abalos tão intensos, que o cunho dos mesmos se torna legível em traços permanentes sobre seu rosto [traços fisionômicos]; enquanto no que é final e real, trata-se das mesmas coisas que também o animal logra [tem êxito], sobretudo com um dispêndio incomparavelmente menor de afecções e tormentos, afirma o filósofo.

Sob um viés realista, Schopenhauer aponta que “Em consequência de tudo isto, cresce muito mais no homem a medida da dor do que a do prazer, e se incrementa ainda de modo especial por ele saber efetivamente da morte, pois enquanto o animal foge dela [da morte] por instinto, sem propriamente conhecê-la, sem jamais verdadeiramente encará-la, como faz o homem, sempre tendo à sua frente este prospecto.” e isso, sem dúvida, não é de pouca monta. Prossigamos!


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Eis que a Sabedoria reina, mas não governa, por isso, quem pensa (no todo) precisa voltar para a caverna, alertar aos amigos. Nós vamos achar que estais louco, mas sabes que cegos estamos nós, prisioneiros acorrentados à escuridão da caverna.

Abordo "O mito da caverna", de Platão - Livro VII da República.

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A necessidade da ordem (kósmos), da harmonia, da temperança (sophrosyne) em contraponto ao caos, à desmedida (hýbris) ou, numa linguagem nietzschiana, o apolíneo versus o dionisíaco, constitui a base de toda antiga pedagogia (Paidéia) tão cara à aristocracia grega (arístois, os melhores, os bem-nascidos posto que "educados").

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