Em
Florença eclode a Idade de Ouro, legando gênios inimagináveis.
Como
vimos no artigo anterior (AQUI), no
início do século XIV (1300 em diante), fim da Idade Média, surge o
questionamento quanto a religião ser a única fonte de saber e a
descoberta de uma realidade para além dos muros da Igreja. É quando
o renascentista coloca-se como centro do universo, capaz de ser dono
de seu destino, erigindo as bases do que chamamos humanismo.
Já na segunda metade dos anos 1400, com Lorenzo di Médici - O Magnífico - à frente, Florença se torna então o centro mais culto, refinado e de maior potência econômica e política da Itália, florescendo e expandindo o campo das artes, das letras e da filosofia.
Já na segunda metade dos anos 1400, com Lorenzo di Médici - O Magnífico - à frente, Florença se torna então o centro mais culto, refinado e de maior potência econômica e política da Itália, florescendo e expandindo o campo das artes, das letras e da filosofia.
Todas
essas mudanças bruscas no modo de pensar e ver o mundo estimulou o
nascimento de uma forma totalmente nova de expressão artística,
algo repleto de vigor, ousadia e frescor.
Uma
das características do Renascimento é o que hoje chamamos de
interdisciplinariedade que, versátil, dialoga com diversas áreas da
ciência e das artes. Vários artistas, além de pintores eram também
escultores. Muitos redigiam textos científicos, poesias e
dedicavam-se a ourivesaria.
Entretanto,
alguns começaram a se especializar em determinada área, buscando o
reconhecimento nela (Michelangelo, por exemplo, ansiava firmar-se e
ser reconhecido como escultor).
Nesse
empenho por se afirmar como profissional “especializado”, o
artista vai modificando suas condições de vida. Devido a isso, no
período “Quatrocento” do Renascimento, o pagamento por jornada
de trabalho vai se restringindo às tarefas puramente artesanais,
como as cópias e restaurações.
Com
maior reconhecimento, os artistas passam a ser mais exigentes, a ter
seus caprichos, impor condições.
Em
contrapartida, para não ficar refém de seus humores (vez ou outra
abandonavam um trabalho pela metade), tornou-se comum o pedido de um
fiador por parte de quem encomendava uma obra, a fim de garantir o
cumprimento do contrato.
Nessa
fase, o prestígio dos artistas era tanto que eles desfrutavam de
liberdade para, além de poder escolher que tipos de obra desejavam
executar, qual tema preferiam trabalhar.
Claro
que toda essa emancipação passa a exigir a profissionalização das
especialidades. E os jovens aprendizes foram levados a ampliar seus
conhecimentos, não somente nas oficinas, mas nas Academias que
proporcionavam o aprofundamento nos estudos de anatomia, geometria e
perspectiva, por exemplo.
Os
artistas se sentiam mais livres, pois menos reféns da Igreja: agora,
eles contavam também com o patrocínio das ricas famílias, pois
“cacife” para bancar e manter filósofos, músicos por perto era
a nova “régua” com a qual os poderosos se mediam entre si,
reivindicando “nobreza”. Foi então que a mitologia grega, as
grandes batalhas e as alegorias se tornaram os temas prediletos.
Também era praxe a encomenda de pinturas que retratassem o casamento de um filho ou a imagem da filha, a fim de despertar curiosidade, rumores e, quem sabe, a conquista do clássico “bom partido”. Sem falar das cenas cotidianas, onde queriam se mostrar aos demais ostentando a opulência de que estavam cercados.
Também era praxe a encomenda de pinturas que retratassem o casamento de um filho ou a imagem da filha, a fim de despertar curiosidade, rumores e, quem sabe, a conquista do clássico “bom partido”. Sem falar das cenas cotidianas, onde queriam se mostrar aos demais ostentando a opulência de que estavam cercados.
Simonetta Vespucci foi casada com Marco Vespucci, primo do famoso navegador Américo Vespucci. Era considerada a mulher mais bela de Florença e serviu de modelo para as duas mais famosas obras de Botticelli. Dizem que foi amante de Giuliano, irmão caçula de Lorenzo di Médici. A tuberculose a ceifou bem jovem, com apenas 23 anos.
Se
com a Igreja o “divino” é o que inspirava e estava por trás das
obras, com o mecenato (sistema de proteção e incentivo dado pelas
ricas famílias patrocinando-os), o artista ganha mais autonomia e
reivindica sua individualidade, sua originalidade, passando a assinar
suas obras. Era o início do que hoje chamamos de propriedade
intelectual. E, vaidosos, eles travaram verdadeiras batalhas entre
si, competindo por maior reconhecimento de sua genialidade.
Ainda
sobre o mecenato, atividade que se iniciou no Renascimento e é
exercida até hoje por pessoas físicas ou jurídicas, deriva seu
nome de Caio Mecenas (68 a.C. – 8 a.C.), ministro e conselheiro que
apoiava a produção artística de sua época, formando um círculo
de intelectuais e poetas.
Tamanho
apreço e investimento legou uma considerável coleção artística
secular, não somente em pinturas e esculturas, mas também em
bordados, tapeçarias, vitrais, adornos, joias, murais e objetos
domésticos, como bandejas, espelhos, camas, arcas, vasos, etc.
Com
toda essa avalanche de propostas de requinte e beleza, o papel da
arte na sociedade transcende o caráter meramente estético ou
funcional, ganha respeito, passando a gozar de muito prestígio e
valor. Por isso, é também no “Quatrocento” que surge a figura
do colecionador.
Alessandro
Mariano di Vanni Filipepi nasceu em 1º de março de 1445, numa
família de artesãos florentinos (seu pai era também curtidor de
peles). Ainda menino, logo cedo aprendeu a profissão de ourives, mas
descobriu que seu talento era mesmo a pintura.
Com
17 anos foi estudar com Fra Filippo Lippi, um dos grandes mestres
florentinos que influenciou muito suas primeiras obras. Apesar da boa
relação com esse mestre, o aprendiz parte em busca de sua
independência e, com ajuda financeira de seu pai, monta seu próprio
ateliê.
Foi
nessa época que Lorenzo di Médici buscava pintores para ornar o
salão do Tribunal da Mercanzia, com o tema das Sete Virtudes. O
irmão de Botticelli, Antônio Filipepi, que era ourives, viu nisso
uma oportunidade de introduzir o jovem no mecenato dos Médici. Com a
ajuda de Tommaso Soderini, pessoa de confiança de Lorenzo, o jovem
Sandro recebe então, a incumbência de retratar a Virtude da
Coragem.
Alegoria da Virtude da Coragem, de Botticelli (1470), Galleria degli Ufizzi, Florença.
Ele
agarrou a oportunidade com pincéis, unhas e dentes e, graças a seu
empenho, esse trabalho (alegoria da virtude da Coragem) se mostrou
superior às demais. Confira a análise de famosas obras de Botticeli
logo abaixo.
Detalhe da Virtude da Coragem, de Botticelli (1470), Galleria degli Ufizzi, Florença.
Depois
disso, ele ganhou a confiança de Lorenzo e passou a trabalhar
regularmente para a família Médici. À partir de então, além de
qualidade seu trabalho também tinha visibilidade e o que lhe abriu
as portas para encomendas de outras abastadas famílias florentinas.
Botticelli,
que se inspirava nos temas pagãos e seus deuses (Mercúrio, Vênus,
Marte, Apolo, Diana, Minerva, etc), também se dedicou às obras
cristãs. Mas sempre mantendo seu compromisso com os Médici,
reproduzindo os rostos de vários membros da família até mesmo em
suas obras religiosas.
Roma
também se encantou e quis o artista para suas obras. Ele angaria
prestígio e reconhecimento a ponto do papa Sixto IV convidá-lo a
trabalhar na Capela Sistina.
"A tentação de Cristo", de Sandro Botticelli (1481-82). Museu do Vaticano, Roma.
Detalhe da "Tentação de Cristo", Museu do Vaticano, Roma.
A
morte de Lorenzo de Médici, em 1492, foi seguida de grande agitação
política e religiosa. O conflito entre a Igreja e o frei Savonarola
(perseguido e queimado numa fogueira por heresia) inspirou Botticelli
a retratar os mártires cristãos em suas lutas, sofrimentos e
abnegações.
Detalhe da obra "A calúnia de Apeles" (1495), Botticelli retrata a fealdade (feiúra) de uma anciã maltrapilha (numa alusão à Igreja) voltando sua face à verdade nua e crua, que aponta para os céus. Galleria degli Ufizzi, Florença.
Conhecido
por seu fantástico bom humor (nem mesmo a acusação anônima de que
mantinha casos amorosos com seus aprendizes o abalou), Botticelli
fica arrasado com a morte de Savonarola e se afasta da vida pública,
passando a se dedicar aos estudos e à meditação. E foi assim,
recluso e solitário, que em 17 de maio de 1510, ele faleceu em
Florença.
A
perseguição pelo ideal de beleza e glória é marca do
Renascimento. Prossigamos nessa ascese.
Mais Botticelli's...
Coroação da Virgem Nossa Senhora da Assunção (1481-83). Galleria degli Ufizzi, Florença.
Detalhe da coroação da Virgem Nossa Senhora da Assunção (1481-83). Galleria degli Ufizzi, Florença.
A primavera...
A alegoria da Primavera (1472-73), de Sandro Botticelli. Galleria degli Ufizzi, Florença. Botticelli foi o primeiro a trazer um tema exclusivamente mitológico. Posteriormente, a admiração pela Antiguidade clássica, pela civilização grega antiga será uma das características básicas da Renascença.
As
duas obras mais famosas de Botticelli são “A Primavera” e “O
nascimento de Vênus”, encomendadas pelos Médici (Galleria degli
Uffizi).
“A
Primavera” é considerada mais intensa e, portanto, superior ao
“Nascimento” foi destinada originalmente para a Villa di
Castello, residência de verão da família Médici. É considerado
um dos mais belos da Renascença italiana.
Nessa
composição, Botticelli explicita sua característica de fuga
intencional de forma realista. Segundo o estudioso Adriano Colangelo,
com sensibilidade quase lírica, ele é um criador de linhas rítmicas
e melodiosas extraordinárias, com uma originalidade expressiva ao
abordar o mundo lendário da mitologia grega com uma poética
surpreendente.
A
obra reflete a habilidade de desenhista de Botticelli, algo
fundamental para a arte florentina da época. Com sensibilidade, ele
cria uma atmosfera de sonho, de fábula, sobre as quais se movimentam
imagens fantásticas, fora de qualquer tempo, evocando divindades
lendárias pagãs, como se fossem de um maravilhoso mundo
desconhecido.
De
fato, observamos que as figuras – de uma beleza perturbadora –,
emergem quase que de improviso, evocando divindades da terra, do
vento e das florestas, distribuindo flores, folhas e ar puro.
O
gesticular de todas as figuras é delicado, elegante, rítmico e
sintetizam o ideal físico e ao mesmo tempo universal de beleza.
São
seis figuras femininas, duas masculinas e um Cupido (Eros) numa
plantação de laranjas entre centenas de espécies de plantas e mais
de uma centena de tipos de flores. O quadro talvez tenha sido
inspirado por um poema de Ovídio sobre a chegada da Primavera.
Vamos
à leitura da imagem, da direita para a esquerda: Zéfiro, o vento
cortante de março, retratado num tom azul acinzentado e com asas,
sequestra e possui a ninfa Flora (conhecida pelos gregos como
Clóris), que usa uma diáfana túnica, transparente como um véu.
Zéfiro com Primavera (que na verdade é a ninfa Flora, conhecida pelos gregos como Clóris)
As
bochechas de Zéfiro estão inchadas e, por ser a divindade
“invisível” que é, seu diferente espectro separa-o dos demais.
As
árvores ao redor dele também sopram em sua direção, assim como na
túnica de Flora, que ele está soerguendo enquanto flores e folhas
frescas surgem de seus lábios. Flora era muito venerada entre os
Sabinos, que levaram seu culto a Roma.
Conta-se
que depois de arrebatá-la, Zéfiro fez dela sua esposa,
conservando-a no esplendor da juventude e presenteando-a com o
império das flores. Ele a torna então, deusa da Primavera,
portadora da vida eterna, a espalhar rosas pelo chão. É por isso
que os poetas costumam inserir o casal no cortejo da Primavera.
Observem que Primavera possui um abdome proeminente por baixo do vestido, como que indicando algo que lhe é mesmo tão peculiar: a germinação.
A
Primavera é essa figura feminina coroada de flores num vestido de
estampa também floral a espalhar rosas, recolhidas nas dobras do seu
vestido, representando a mais bela estação do ano.
Detalhes das flores na obra "A primavera", de Sandro Botticelli.
Segundo Cunningham e Reich, a obra é uma elaborada alegoria mitológica da fertilidade florescente do mundo.
A
exaltação ao máximo do ideal de beleza como o ponto alto de um
sonho é plenamente realizado no Renascimento florentino através de
Botticelli.
Em
destaque, pois centralizada e visivelmente acima das outras figuras
está uma mulher vestida de branco com um belo manto vermelho de
fundo azul. Em seu semblante se observa um plácido olhar de
espectadora que abençoa.
As
árvores atrás dela formam um arco destacando-a ao centro. Somente
ela e Mercúrio portam sandálias. Talvez porque somente Vênus
(Afrodite) e Mercúrio (Hermes) sejam deuses da mitologia grega,
enquanto os demais, alegorias.
Elas são três: Aglaé (brilhante), Talia (verdejante) e Eufrosina (alegria da alma).
Agrupadas,
à esquerda, três graciosas jovens – As três Graças – em
trajes branco e diáfano, unem as mãos com delicadeza enquanto
dançam de forma sensual e suave.
Segundo
o mito, as Graças eram filhas de Eurínome (ou Juno/Hera) e Júpiter
(Zeus) ou ainda, noutras versões, de Bacco (Dioniso) e Vênus
(Afrodite).
São
fiéis companheiras da deusa do amor e da beleza, Vênus (Afrodite),
a quem devem a graciosidade, o encanto e todos os atrativos que
garantem triunfo. O poder das Graças se estende sobre todos os
divertimentos da vida.
Elas
dispensam aos seres humanos não somente a boa vontade, a alegria e
as boas maneiras, mas também a eloquência e a prudência. Elas
presidem ainda os benefícios da gratidão.
Duas das Graças usam colares bem destacados (joias com as cores da família Médici).
As
Graças são sempre representadas jovens, castas (pudicas) e
elegantes a bailar. Os artistas as retratam nuas ou envoltas em
túnicas leves, como véus flutuantes. Elas partilhavam também as
honras que se rendia ao Amor, personificado por Vênus (Afrodite), a
Mercúrio (Hermes) e às Musas.
A
flechada desse inocente "anjinho" arrebata qualquer um,
podendo nos alçar, imediatamente, ao paraíso.
Um
cupido (Eros) bem rechonchudinho sobrevoa sua “mãe”, Vênus
(Afrodite) e, de olhos vendados (como sabemos, o Amor é cego),
aponta sua flecha para as Graças que, alheias a essa ameaça, bailam
tranquila e delicadamente.
O
caduceu de Mercúrio (Hermes) mantém o jardim seguro de nuvens
ameaçadoras. Ele traja uma túnica de cor chamativa, transpassada
por um cinturão que sustenta sua espada, as famosas sandálias
aladas e o elmo que o torna invisível. Seu corpo revela estar
displicente e despreocupado, entretanto, atento aos céus.
Botticelli
inspirou-se no rosto de Juliano di Médici como modelo para retratar
o mensageiro dos deuses, Mercúrio (Hermes, na mitologia grega).
Além
de seu significado evidente que é o anúncio da Primavera, essa
pintura tem sido interpretada como uma ilustração do amor
neoplatônico popularizado entre os Médici, sendo o amor carnal
natural representado por Zéfiro (à direita) e a renúncia
personificada pelas três Graças e por Mercúrio, voltados para
outras coisas.
O
nascimento de Vênus...
"O
nascimento de Vênus", de Sandro Botticelli (1483). Galleria
degli Ufizzi, Firenze. Segundo relatos, Vênus (Afrodite, no mito
grego) surgiu em Páfos, na Ilha de Chipre. Outros dizem que ela
pousou em Cítera, próximo à costa sul da Grécia. Ambas as ilhas
foram dedicadas a seu culto.
Quando
se pensa em beleza, sensualidade e perfeição, basta fechar os olhos
e imaginar “O nascimento de Vênus”. Por conta de tamanho lirismo
e delicadeza, esse quadro tão sublime, de quase três metros de
largura, é considerado um dos símbolos do movimento renascentista.
A
cena retrata o momento em que Vênus (Afrodite) surge da água.
Segundo o antigo poeta grego Hesíodo, em sua obra “Teogonia”
(cerca de 600 a.C.), a esplendorosa deusa do amor e da beleza, a
entidade que preside o encontro, a união ou, numa linguagem
freudiana, a pulsão de libido, nasce após Saturno (Chronos), o
Tempo, ceifar os órgãos genitais de seu pai, o Céu (Ouranós).
Do
esperma que fecunda a espuma do mar (aphros), nasce o amor, e do
sangue, a vingança (personificadas pelas Eríneas).
Sobre
o simbolismo presente na obra, podemos dizer que, enquanto à
esquerda temos o casal composto pelo vento Zéfiro e a ninfa Flora,
conhecida pelos gregos como Clóris (ele transformará em Primavera)
soprando vida e animando a deusa Vênus, do lado direito vemos a
alegoria da Hora, que é filha de Têmis, a justiça divina (noutras
versões, trata-se da própria Primavera), que se apressa para
cobrir-lhe a nudez com um belíssimo manto de flores.
Uma
das interpretações é de que assim é o amor, paradoxalmente,
sensual e casto. Ou, corpóreo, carnal, mundano e também espiritual,
idealizado, platônico.
As
laranjeiras por trás da Hora (Primavera) estão carregadas de flores
brancas com pontas douradas. E as folhas também trazem nervuras em
ouro, assim como o próprio tronco. É como se todo o bosque
estivesse imbuído da presença irradiante da deusa do amor e da
beleza.
Nas
vestes da Hora (Primavera) observamos uma espécie de cinto adornado
de rosas e, em torno de seus ombros, uma delicada guirlanda de mirta
verde, símbolo do amor eterno.
Todas
as figuras parecem flutuar. A concha, na antiguidade grega, era uma
metáfora para o órgão genital feminino. Observem também que o
autor retrata as ondas próximas à concha fielmente, afastando-se,
pinta-as apressadamente em “V”.
É
característico de Botticelli pés e mãos expressivos, bem
delineados, com dedos longos. O pescoço e os ombros –
propositalmente – não seguem as proporções anatômicas reais.
Atentemos ao fato de que Afrodite está cercada por duas ações bem
distintas: uma que, de certa forma, a desnuda e outra que a vela,
certamente impondo pudor.
Botticelli
optou pela pose conhecida por “Vênus Pudica” (observe o
acanhamento da deusa ao tentar esconder os seios com uma das mãos e
a região pubiana com os cabelos). Outros artistas preferiram
retratá-la numa pose mais sensual, chamada de “Vênus Anadyomene”,
quando ela surge nua, enxugando seus longos cabelos.
Detalhe
do rosto de Vênus, cujos traços, segundo os estudiosos, também
foram inspirados na mais bela donzela florentina, Simonetta Vespucci.
Representante
do ideal de beleza clássica muito admirado no início do
Renascimento, em especial nos círculos intelectuais de Florença, a
Vênus de Botticelli expressa um olhar longínquo. Segundo Robert
Cumming, os rostos pintados por ele parecem recolhidos em seu mundo
interior, perdidos em seus pensamentos.
O
artista sempre destaca a estrutura óssea sob a pele, maxilares bem
marcados e narizes elegantes. No entanto, a severidade dos traços do
rosto é abrandada com a suavidade dos ondulados cabelos dourados.
Será
que algum outro artista conseguiu expressar com tamanha maestria,
lábios tão convidativos a um beijo quanto esses?
Detalhe
de uma das rosas presentes no "Nascimento".
Segundo
o mito, a rosa, flor consagrada a Vênus, foi criada no seu
nascimento e por sua delicada beleza e fragrância, simboliza o amor.
A presença de espinhos seria para nos lembrar que ele, o amor,
também pode nos ferir.
Marte
e Vênus...
Marte e Vênus, de Sandro Botticelli (1483). National Gallery, Londres.
Já nesta obra, numa clareira rodeada de mirtos, quatro faunos (sátiros) ainda crianças brincam com o elmo e a espada do temível deus da guerra, Marte (Ares). Ele está adormecido, estampa na face a sensação cansaço e, desarmado, encontra-se totalmente submisso à deusa do amor e da beleza, Vênus (Afrodite).
Já nesta obra, numa clareira rodeada de mirtos, quatro faunos (sátiros) ainda crianças brincam com o elmo e a espada do temível deus da guerra, Marte (Ares). Ele está adormecido, estampa na face a sensação cansaço e, desarmado, encontra-se totalmente submisso à deusa do amor e da beleza, Vênus (Afrodite).
Sereno
e imperturbável, ele parece entregue a um sono profundo (nem mesmo o
trompete do fauno em seu ouvido o desperta), talvez devido à
exaustão do ato amoroso. E eis o bélico Marte vulnerável, rendido.
Dizem que Botticelli teria se inspirado no rosto do próprio Juliano
Médici, para essas pinceladas.
Vênus
(Afrodite), que parece uma recatada noiva, de branco com detalhes em
dourado arrematado por um broche em forma de flor, contempla o rosto
do amado, expressando delicada feminilidade. Seu rosto é todo paz.
Ao
observarmos a face de Marte e imediatamente dirigirmos o olhar para a
face de Vênus, concluímos que há uma união de opostos que se
complementam (sono e vigília), garantindo a felicidade do casal.
Entretanto, é ela que, desperta, mantém o controle da situação.
Atentemos
ao sublime que Botticelli explicita nessa obra: é com lucidez, toda
doçura e delicadeza que mantêm-se total domínio sobre essa
violenta divindade. Sim! O amor vence a guerra.
Madonna com o Menino e coro de oito meninos, de Sandro Botticelli
(1478).
Staalich Mussen, Berlin.
Mais uma vez, constatamos a beleza do sublime: nos lírios brancos,
na riqueza de detalhes nas vestes do coro de meninos e nos véus da
Virgem. O semblante dela é de ternura, seu olhar “perdido”,
transmite piedade, compaixão e a mais profunda paz.
Os “fios de ouro” de que são feitos os cabelos, os preciosismos
na renda do véu dessa pudica Madonna, são detalhes que nos faz
reconhecer o grau de perfeição alcançado por Botticelli.
Detalhe do coro de meninos.
É curioso como Alessandro di Mariano di Vanni Filipepi ficou
conhecido por Sandro Botticelli. Sabemos que Sandro é diminutivo de
Alessandro, mas Botticelli é porque “Il Botticello” significa
pequeno barril e assim era conhecido um dos irmãos mais velhos de
nosso renascentista.
A letra “i” ao final de Botticello surgiu mais tarde e isso
porque os estudiosos pensaram que se tratava de um nome de família,
como os Médici -, já que na época estes eram geralmente no plural,
que em italiano termina em “i”.
Palas Athena (Minerva) e o Centauro (1482). Galleria degli Ufizzi,
Florença.
Como esclarecemos, o pioneirismo de Botticelli consiste na ousadia de
ter resgatado a cultura pagã, retratando faunos, centauros, deuses e
alegorias.
O regresso de Judith a Betulia (1472-1473), Galleria degli Ufizzi,
Florença.
Observem que as vestes, tanto de Judith quanto da serva que a
acompanha, deixam o abdome “soltinho”, à vontade. Destacar o
ventre, aludindo maternidade é comum na moda da época, pois
trata-se de um valor positivo para a cultura renascentista.
Perfil do poeta Dante Alighieri, por Sandro Botticelli (1495).
Conhecido como "il sommo poeta", o autor de "A Divina
Comédia" nasceu em Florença, por volta de 1265 e faleceu de
malária em 1321.
Trecho da ilustração sobre o inferno (na Divina Comédia de Dante Alighieri), por Botticelli.
Dedico
esse artigo ao Excelentíssimo Senhor Juiz Federal Sérgio Fernando
Moro.
Referências Bibliográficas:
O livro da Arte (Editora Martins Fontes)
Para entender a arte - Robert Cumming (Editora Ática)
Renascimento - Coleção Quero Saber (Editora Escala)
Iniciação à História da Arte - H.W. Janson e Anthony F., Janson (Ed. Martins Fontes)
Referências Bibliográficas:
O livro da Arte (Editora Martins Fontes)
Para entender a arte - Robert Cumming (Editora Ática)
Renascimento - Coleção Quero Saber (Editora Escala)
Iniciação à História da Arte - H.W. Janson e Anthony F., Janson (Ed. Martins Fontes)
Luciene Felix Lamy
e-mail:
mitologia@esdc.com
3 comentários:
A análise está preciosa! Ficou tão bem concatenada que até passou um filminho ... Obrigada por dividires conosco tanta beleza, Nac
A análise está preciosa! Ficou tão bem concatenada que até passou um filminho ... Obrigada por dividires conosco tanta beleza, Nac
Que análise perfeita!!! Parabéns!!
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